Este artigo é uma resposta à Carta aberta ao Presidente de Moçambique de Carlos Nuno Castel-Branco que pode ser lida aqui no portal.

Por Gustavo Mavie

´´Raptos são uma ocorrência comum em várias partes do mundo hoje, e algumas cidades e países são frequentemente descritos como “Capitais do Sequestro do Mundo´´. A partir de 2007, esse título pertence ao México, possivelmente com 100.000 raptados em cada ano. Em 2004, era aColombia que detinha este título. Apesar de que as estatísticas são mais difíceis de encontrar, há  dados que sugerem que um total mundial de 12,500 a 25,500 raptados em cada ano, com 100.000 para o México´´, in Enciclopedia Wiklipedia.

Quando li, na segunda-feira da semana passada, a carta aberta ao Presidente Armando Guebuza da lavra de Carlos Nuno Castelo Branco, que publicou na Net e em alguns jornais moçambicanos, exigindo ao estadista moçambicano que se demita, porque na sua óptica, governa mal o nosso País como, pior que isso, porque entende que não consegue conter os raptos que assolam algumas cidades moçambicanas, lembrei-me da tese que diz que há pessoas que são como os ratos, que mesmo que vivam uma eternidade numa biblioteca, nunca chegam a saber o conteúdo dos livros que lá estão.

O que me trouxe à memória este caso dos ratos, é porque não percebo como é que um académico como se assume Carlos Nuno Castelo Branco, que estudou em Londres e que é uma das cidades que é uma verdadeira escola natural de sapiência, não se apercebeu que crimes como raptos, de que culpa agora totalmente o Presidente Guebuza, ocorrem em quase todos os países ou pelo menos certas outras cidades mundiais, e que não são de per si prova de má governação de quem quer que seja.

O que mais me surpreendeu, é culpá-lo também por ter, finalmente, ordenado, só a partir de Outubro último, ao exercito moçambicano, para que passasse já da defensiva em que vinha estando, para a ofensiva, em resposta aos repetidos ataques que a Renamo vinha fazendo desde Abril último contra civis, polícias e militares, sem que antes tivesse sido atacada pelo Governo. Não percebo como acusar Guebuza, por ter dado essa luz verde às tropas moçambicanas para contra-atacarem, de modo a frustrar a estratégia da Renamo que era impedir com esses ataques a realização das eleições municipais marcadas para 20 deste mês, e cuja campanha já está em curso agora. Posso admitir que esta estratégia renamista não seja percebida pelo cidadão comum, mas já não pode ser para um académico como o é Castelo Branco.

Mesmo académicos de renome, como o também conceituado jornalista Joseph Hanlon, fizeram já uma leitura realística desprovida de motivações políticas, e concluíram que a culpa de toda esta tensão e escaramuças em que vivemos agora é da exclusiva responsabilidade da Renamo, e não do Governo como a imputa a Guebuza. Hanlon distribuiu, via Net, a 27 do mês passado, um artigo em que comprova com factos irrefutáveis, que foi a Renamo que começou por fazer discursos belicistas desde Fevereiro deste ano. Ele mostra que depois desses discursos inflamatórios, começou depois a atacar, melhor, a matar civis, polícias e militares, sem que nunca antes tivesse sido alvo de nenhum ataque do governo, e que este só foi forçado a retaliar a partir de Outubro, ou seja, sete meses depois da Renamo ter estado a atacar e matar civis, policias e soldados! Um desses ataques da Renamo foi contra o Paiol de Savane em Abril último, em Sofala, em que matou a sangue frio, seis dos soldados que o guarneciam. Dois dias depois, a mesma Renamo atacou um camião tanque e um machimbombo em Muxungwé, que resultou na morte de três pessoas. Tudo isto, meses antes que o Governo tivesse feito aquele assaltado e subsequente tomada de Santungira a 21 de Outubro último.

Como vê, Carlos Nuno Castelo-Branco, atribuir culpas a Guebuza pela reactivação da guerra em Moçambique, é uma acusação a todas as luzes injusta. Mesmo que esta acusação seja feita pela maioria dos moçambicanos, como o diz sem que nos diga como é que chegou a essa conclusão, não é por isso que será justa. A História diz nos que há vezes em que as maiorias apoiaram causas erradas ou pessoas eivadas de maldade ou mesmo incendiários. Hitler foi eleito pela maioria dos alemães, e o errático Kumba Yalá, da Guiné Bissau, foi também catapultado ao poder pela maioria dos guinenses, mas Hitler acabou arrastando os seus compatriotas para a guerra que moveu contra todo o mundo. Ele foi tão mau para os alemães como para o resto da humanidade que o melhor era nunca ter nascido.

A sua formação académica o obriga a ler correctamente os factos e a ajudar os outros que não foram muito para além da aprendizagem escolástica, de modo que sejam capazes de compreender também os fenómenos político-sociais e militares. É o que fez Hanlon nesse seu artigo com o título ´´History Matters´´, ou seja, ´´A Historia Conta´´. Ele vinca que para se perceber a tensão e as escaramuças que agora ocorrem, há que se recuar no tempo, para se ver como tudo foi acontecendo até se chegar onde chegou. Já Cícero dizia que para se compreender o presente, há que se ter em conta o passado. A História da Renamo já explica o que está a fazer de novo agora.

Mesmo o académico sul-africano, Andre Thomashausen, que já foi um apoiante da Renamo, disse, quarta-feira da semana passada à televisão moçambicana TIM, que o problema é da Renamo, que não conseguiu passar de movimento rebelde para partido político, e que isso faz com que os moçambicanos tenham medo sempre que ouvem falar dela.

Eu próprio, escrevi um artigo com base na análise de Hanlon, que o Notícias publicou no sábado último dia 02 que caso o não leu o aconselho a lê-lo retroactivamente, com o título ´´Inimigo do Inimigo Amigo É´´, em que deixo claro que os que condenam Guebuza pelo reinício da guerra em Moçambique, só o podem fazer por uma de duas razões: ou ignoram o que a Renamo foi dizendo, e os ataques que vinha fazendo sem nunca ter sido atacado antes, ou o culpam porque não gostam do Guebuza por qualquer das razões. Este deve ser, certamente, o caso de Castelo-Branco, porque deixa bem claro que o odeia simplesmente, e isso está claramente estampado nesta sua missiva que de tão má é capaz de vir a constar no livro de recordes Guiness Book como uma das piores cartas. Esta sua carta foi uma bala que lhe saiu pela culatra.

Recomendado para si:   Advogado é investigado por branqueamento de capitais e obstrução à justiça

Não há péssimo julgamento do que condenar alguém por crimes que nunca cometeu. Se quer ser justo e bom para nós seus compatriotas, condena a Renamo que foi quem começou de novo com os tiros, e não Guebuza que só está a combater estes criminosos que são os alguns dos homens da Renamo que até atacam centros de saúde para matar pessoas que estão a tentar evitar a morte.

Há, na sua carta, uma clara evidência de que não tem em que de facto acusar Guebuza, daí que até o acusa de ser culpado mesmo pelos raptos que afectam Maputo, Beira e, de algum modo, Nampula, quando mesmo países munidos de meios sofisticados de vigilância das suas cidades, como os EUA, que têm câmaras que filmam até formigas, registam também raptos. Mesmo a nossa vizinha África do Sul que, tal como os EUA que tem a famosa FBI, tem polícias especializadas só para este tipo de crimes, é também vítima deste mesmo mal e é um dos 10 países que mais raptos regista em todo o mundo. Estes 10 países são agora encabeçados pelo México, onde, como dissemos já, regista-se 100.000 raptos por ano, ao invés do nosso, que até agora registou um máximo de 50 raptados. O México é seguido por ordem decrescente, pelo Iraque, Índia, a própria África do África, o Brasil, Paquistão, Equador, Venezuela, Colômbia e, finalmente o Bangladesh.  Muitos destes países têm estado neste TOP 10, desde 1999, e que neste ano a lista era encabeçada pela Colômbia, e pela mesma ordem decrescente, seguiam o México, o Brasil, as Filipinas, a Venezuela, o Ecuador, a Rússia, a Nigéria, a Índia e, finalmente, a África do Sul que agora passou deste 10.o lugar para 0 4.o. Ora, será que todos estes países são governados por Guebuza? Ou está a aplicar a falsa tese que diz que o mesmo pode não ser o mesmo, como quando se dizia no outro tempo aqui em Moçambique que quando um preto corria era um ladrão, e quando era um branco a fazer o mesmo, é um atleta.

É importante destacar que no caso do Brasil, já esteve neste lista quando era liderado pelo Presidente pro-povo, melhor, pro-pobres, Lula da Silva, mas que nem com isso ele conseguiu combater totalmente todos os raptores, e até hoje muitos dos magnatas brasileiros só viajam mais de helicópteros para não serem raptados. Mesmo Portugal, que agora se oferece para nos ajudar a combater os raptores, é também vítima de raptos, e o último ocorreu este fim-de-semana contra um médico. O que o Carlos Nuno devia fazer, é apelar aos outros compatriotas a adoptarem medidas anti rapto, como se faz noutros países. No Brasil, por exemplo, os magnatas até já andam mais de helicópteros que de carros. Outra das medidas é usarmos mais dinheiro digital e não vivo nos pagamentos como ainda é comum entre nós.

Mesmo as escaramuças que ocorrem um pouco pelo centro do Pais e em algumas províncias do Norte, são da exclusiva culpa da Renamo, que foi quem começou a atacar civis, polícias e militares. Ou querias que Guebuza ordenasse as tropas a se deixarem matar. Porque não condena a Renamo por ter sido quem começou com os ataques. Surpreende-me esta sua falta de coerência. Ou será porque quando a Renamo atacava estava em sintonia com os seus interesses, já que Balzac diz que os interesses se sobrepõem aos sentimentos. Deve condenar a Renamo porque está a voltar a matar civis como o fazia durante a guerra dos 16 anos que moveu até 1992, e de que Castelo-Branco conhece muito bem, porque na altura era um oficial do exército moçambicano. A menos que sofra de amnésia para se ter esquecido dos seus massacres.

O senhor Carlos Nuno Castelo-Branco e todos os que comungam da mesma visão, como Alice Mabota, deviam saber que se há quem sabe por experiência própria, o quão custou esta paz que agora a Renamo quer voltar a quebrar, certamente que Guebuza é um deles. Isto porque foi ele que chefiou, durante dois anos e meio, a Delegação do então Governo do Presidente Chissano, que a negociou em Roma com a da Renamo, e que tinha como chefe, Raul Domingo, que mais tarde viria a ser expulso da mesma Renamo por Dhlakama.

No lugar de fazer uma análise académica fria, e apontar quem de facto é culpado, deixou-se levar por motivações políticas, e chegar a conclusões politizadas e, logo, erradas ou de má-fé. Para tentar dar uma veracidade aparente, cita alguns dos palavrões que foram proferidos contra Guebuza por algumas das pessoas que estavam na manifestação contra os raptos em Maputo, e as escaramuças provocadas pela Renamo, como algo que prova que todo o povo é anti-Guebuza.

Quanto aos que gritaram fora,fora,fora Guebuza, na verdadade  tentaram, com isso, ´´raptar´´ aquela manifestação contra os raptos, para servir os seus interesses inconfessos, como bem o disse no dia seguinte, o analista político, Esausto Mahanjane, à Radio portuguesa RDP. É que se assumirmos que os raptos são prova de má governação de Guebuza, como o tenta fazer crer, então os que ocorrem noutros países, incluindo nos EUA e no México, em que neste caso chegam a 100.000 por ano neste momento, então os seus respectivos presidentes são maus e deviam se demitir, incluindo Obama.

O governo tolerou muitos dos ataques antes de retaliar

Na verdade, foi pela repetição desses ataques, que forçaram Guebuza a ordenar o exército a retaliar, porque estava sendo dizimado pelos homens armados de Dhlakama, que confundia com o que chamou de piriquitos. Mesmo assim, o exército optou pela defensiva temperada com apelos de Guebuza para que não mais fizesse ataques, mas perante a persistência da Renamo, teve de enveredar pela presente ofensiva, que acabou na tomada de Santungira, onde vivia o seu líder, Afonso Dhlakama. Se quer ter mais detalhes sobre os antecedentes, leia o artigo de Hanlon ou mesmo esse meu que publiquei na edição do Notícias de 02 deste mês.

Caso pretenda responder a este artigo com outro texto, envie-nos aqui ou simplesmente comente no formulário abaixo.