Relatos de um estudante moçambicano: Parte 1: A História da Ana
A Ana era aluna do ensino Secundário e pretendia futuramente formar-se na faculdade como professora de português. Ela era boa aluna mas tem dificuldades com as disciplinas de inglês e francês, por isso ela costumava me pedir algumas explicações de inglês.
E eu notei que mesmo com esforço ela simplesmente não conseguia entender nada, e se continuasse assim certamente iria chumbar a inglês. Alguma coisa estava a faltar das classes anteriores, parecia que ela estava a ter inglês pela primeira vez, era como ensinar o abecedário a uma criança de 2 anos, e eu sempre me perguntava como é que ela havia conseguido chegar até a 12 sem saber nada daquela disciplina.
Os exames estavam próximos e ela tinha boas médias em todas disciplinas, excepto a inglês e francês, mesmo com o esforço que ela fazia para aprender. O professor de francês – Tomé, que era um professor honesto e muito simpático, decidiu ajudar a miúda e deu-lhe um 11 – que era mais do que suficiente para ela ir ao exame. Tudo que ele exigiu em troca foi que ela tivesse boa nota no exame.
– Vou te deixar ir ao exame, basta prometeres que vais passar. Foi o que ele disse.
Ela agradeceu imenso, e aliviada, só tinha que tentar pedir uma ajudinha ao professor Flávio que a ajudara no ano anterior na disciplina de inglês.
Ela conseguiu a nota para o exame depois de ter aceite fazer sexo com o professor, algo muito comum nas escolas secundárias. Quando ela me contou isso eu fiquei decepcionado e fui embora, mas depois de pensar um pouco eu fui lá ouvir o resto da história.
A Ana teve boas notas nos exames em especial a inglês, embora ela me tenha dito que fizera mal o exame – o que me leva a pensar que ela esteve mais uma vez com o stor Flávio.
Ana não consegui entrar na Faculdade pública no primeiro ano, por isso ela ficou em casa, e nesse tempo ela teve um filho e passou a viver maritalmente com o Zé.
No ano seguinte ela concorreu a uma vaga na Universidade Pedagógica e conseguiu entrar. Lá ela conheceu o Google, a Wikipédia e outras ferramentas excelentes de pesquisa, ao mesmo tempo que esquecia o caminho para biblioteca.
Hoje ela é professora de inglês das 10ª e 11ª classes. Sempre que conversamos ela reclama que os alunos não entendem nada. E como são todos burros, vão todos passar para a 12.
Eu preferi escrever esta pequena história, que é um retrato ameno daquilo que é o nosso sistema de ensino público para mostrar que infelizmente se este círculo vicioso continuar como está, não haverá cura para nossa educação.